Dia do Café: confira conversa sobre cafés especiais com Rani, proprietária do Quintal da Barista

Por Fabricio Lima*

No Brasil, o Dia Mundial do Café é celebrado no dia 14 de abril. Porém, nem todos os cafés são iguais. Existem os chamados “cafés especiais”, e para falar um pouco sobre essa bebida muito presente na vida dos paraenses, o Portal Jambu conversou com Raniely Oliveira, a Rani, proprietária e uma das idealizadoras do Quintal da Barista, a primeira casa de cafés especiais do bairro do Jurunas.

Com a proposta de trazer grãos de todo o país, o estabelecimento tem como objetivo democratizar o acesso e conhecimento sobre cafés especiais na periferia. A cafeteria é integrada ao espaço Gueto Hub, uma biblioteca comunitária localizada na Travessa Quintino Bocaiúva, próximo à Avenida Roberto Camelier.

 

Cafés Especiais

Rani esclarece o motivo do nome: “O café é uma fruta, e assim como todas as outras, pra chegar na bebida ele passa por vários processos. Durante cada etapa dessa, existe um processo que se você fizer de uma forma bem cuidada, assistida, ela se torna uma bebida especial. Então o que a gente considera café especial é justamente aquelas que são melhor selecionadas, que tem tamanhos padronizados. O café especial vai ser diferente em vários aspectos do café tradicional que vende no supermercado. É o que a gente tenta comercializar aqui dentro da comunidade, trazendo essa ideia da experiência e não só um cafézinho de padaria, que você toma em todo lugar. É uma coisa de afeto também. Hoje existem produções de café indígenas, amazônidas, e são esses que a gente procura trabalhar também.”

 

O Dia do Café

Segundo Rani, o dia foi estabelecido por ser o dia da colheita do café no país. O dia 14 de abril, ela explica, é mais um dia que marca algum processo do café. Para ela, isso propõe um desafio, uma vez que ela e a esposa procuram não seguir o que ela chama de “calendário comercial”.

Ela explica: “Eu acho que hoje, o desafio de empreender é justamente isso, tu conseguir colocar a tua marca, a tua essência de uma forma que tu não caia nas mãos dos outros, no sentido de tu perder a tua linha. Um dos desafios que a gente tem é justamente em relação a datas comemorativas, porque quando tu vai falar com alguém que trabalha com redes sociais a primeira coisa que a pessoa fala é ‘ah, vamos fazer um sorteio no dia do café’, por exemplo.”

“Não é uma coisa que necessariamente beneficia o negócio local e nem beneficia de tu trazeres um cliente que seja realmente fiel. Porque aquele cliente vai vir por causa do sorteio, ele não vai vir porque ele gosta de café, porque ele se identificou com a minha marca”, comenta.

 

Afetos e trajetórias

Rani é natural de Macapá e veio para Belém com o objetivo de estudar, mas acabou precisando abandonar os estudos para trabalhar: “Eu me mudei de Macapá para cá Belém para estudar, só que chegou aqui eu vi que a realidade era outra, eu tive que parar e comecei a trabalhar. Isso já faz uns 6 anos. Comecei a me especializar em atendimento, essa parte da gerência também, eu já fazia alguns cursos, e num desses trabalhos eu entrei como caixa numa cafeteria”, ela conta.

A proximidade física e o gosto já existente pela bebida despertaram seu interesse: “Nessa cafeteria era tão pequenino o corredor que eu ficava de costas para a máquina de café. Eu ficava de olho, sentia o cheiro do café”, relembra. A partir disso, ela expressou o interesse em aprender a operar a máquina de cafés: “Comecei a mexer na máquina enquanto eu estava no caixa. Aí eu comecei a substituir a barista quando ela não tava – e eu comecei a ter esse movimento, e quando precisou que ela saísse eu assumi a máquina de café e virei barista da casa  depois de um ano já como caixa”, explica.

Depois disso, ela procurou fazer cursos, com o objetivo complementar a parte operacional que já havia aprendido, e também entender mais sobre cafés. ela adiciona: “A minha relação com o café começou aí e não parou mais. A partir daí só trabalhei em cafeterias. Tô aí faz pelo menos quatro anos trabalhando só com café”

 

O Quintal da Barista

Foto: Fabricio Lima

A ideia da cafeteria de Rani, que completa um ano em maio desse ano, surgiu a partir do encontro com sua esposa, Sam, que também é barista: “Ela também já trabalhava com café e a gente perguntou simultaneamente ‘ué, por que tu não tens tua cafeteria se tu sabe tanto?’”, ela conta.

A oportunidade perfeita surgiu quando ela e a esposa viram no Instagram um anúncio do Gueto Hub, que estava a procura de uma parceria para assumir a lanchonete do espaço. Na época, Rani já estava com planos para abrir uma cafeteria no Marajó, terra natal de sua esposa. Como o local fica a um quarteirão de sua casa, ela não pensou duas vezes em entrar em contato com Jean, o proprietário da biblioteca.

Para ela, o objetivo principal da cafeteria é descentralizar esse tipo de espaço do centro de Belém: “Hoje em dia as cafeterias todas são no centro de Belém. Mas, a gente mora aqui no Honorio, literalmente aqui na outra esquina. Era justamente isso que a gente queria, levar o café especial pra mais gente, para as pessoas conhecerem, e aqui foi uma oportunidade trazer essa mesma essência, só que pra uma biblioteca comunitária.”

 

A relação do paraense com o café

Apesar de ser natural de Macapá, Rani tem suas raízes no Pará, e também memórias afetivas em relação ao café: “Eu não sou do Pará, mas a minha avó é de Colares, e tinha muito isso, ela acordava a gente num certo horário e era uma mesa gigante com tudo que tinha sobrado do dia anterior e um cafézinho passado na hora com um pouquinho de camomila, então tem toda essa ideia afetiva atrás do café”, ela lembra.

Ela acrescenta também que a própria produção do café como é feito na Amazônia é de cunho familiar e tem muito do fator afetivo envolvido: “Essas fazendas que hoje são produtoras de café na Amazônia, elas tem muito isso envolvido, é uma produção familiar, é uma coisa que são os filhos que herdaram dos pais, que herdaram dos avós. Se a gente olhar com mais cuidado, eu acredito que todos os produtos, principalmente esses que são mais bem cuidados, todos eles vão ter uma história com uma essência bem bonita por trás, e com o café não é diferente.”

 

Bebidas e Espaço

“Com certeza a bebida mais pedida é o Moka, mas hoje a gente conta com cappuccino, expresso, café com leite e o moka são as quatro principais. A gente também faz o café coado, mas é uma coisa que surgiu recentemente que a gente tá tentando inserir ainda, porque como é com café especial ele fica um pouquinho diferente do que aquele que a gente faz em casa. O moka é uma base de calda chocolate, como se fosse um brigadeiro de chocolate que também vai café, leite cremoso e uma dose de expresso”, diz.

Para a barista, o fato da cafeteria funcionar dentro de uma biblioteca proporciona formatos interessantes para o atendimento. “A gente pode receber até 15 pessoas ao mesmo tempo, e a gente fica limitado porque aqui as pessoas vem pra estudar, pra trabalhar, podes hoje trazer teu computador, tem wifi liberado, e ficar por aqui. Por exemplo, hoje que está chovendo não dá pra colocar as mesas lá fora, então já tomaria um pouco da biblioteca. Mas, apesar disso acontecer, existem os dias que são mais pico de famílias vindo, de casal vindo se conhecer, mas a maioria que vem é mais de quatro pessoas. E aí vira essa coisa de quase uma egrégora em volta do café”, afirma.

 

O Gueto Hub nas palavras de Rani

Foto: Fabricio Lima

“O Gueto hoje é uma rede de bibliotecas da Amazônia, e surgiu com o intuito de trazer uma biblioteca para a periferia. Aqui as pessoas podem vir para ler, trabalhar, trazer computador. Pode também emprestar livros durante uma semana, ou o tempo que precisar se for pra consulta pra escola. Tem gente que vem pra fazer trabalho, tem gente que vem só pra ler, tem gente que vem pra reunir com os amigos. Hoje o Hub é essa ideia, um espaço que contém de tudo um pouco e pode abarcar de tudo um pouco mas não perde essa essência que foi a primeira, a biblioteca. Todos os movimentos que acontecem na biblioteca o café se adapta, a gente não funciona de forma independente, mas também não é totalmente dependente”, conclui.

 

 

 

 

 

O Portal Jambu é um espaço de jornalismo experimental com matérias produzidas por estudantes de graduação da Faculdade de Comunicação da UFPA sob a coordenação da Profa. Dra. Regina Lima e do jornalista Marcos Melo.

*Com supervisão de Giullia Moreira.

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