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Por Kelvyn Gomes | Fotos: Acervo pessoal do cantor

Cantor, compositor e instrumentista, aos 20 anos, o paraense João Daibes já subiu nos mais diferentes palcos, desde aqueles mais intimistas em um barzinho na noite de Belém, como do majestoso Teatro da Paz e de festivais, como o de música de Ourém.

Ainda que tímido, João encarou as câmeras e a equipe do Perfil Jambu com o carisma que completa sua essência. Cercado pelos olhos atentos e ansiosos do grupo que o rodeava nos estúdios da Faculdade de Comunicação da UFPA, ele até tentou “fugir” das câmeras, mas a paixão pela música falou mais alto e nos deu a chance de conhecer um pouco mais a história de vida que se confunde com a música.

João se apresenta como um artista nortista, paraense, pianista, compositor, músico popular e cantor. Ufa! São tantas as faces e facetas de João Daibes que ao longo da conversa outras vão se apresentando. Ainda que não haja outros músicos na família, seu pai é psicólogo e a mãe engenheira, ele garante que sua história com a música tem haver com sua relação com os pais. Ele lembra quando, ainda muito criança, o pai o buscava na escola e ao chegar na sala de casa ouviam e cantarolavam um disco em que o instrumentista e compositor Egberto Gismonti interpreta o também compositor e maestro Heitor Villa Lobos. “O trenzinho do caipira eu adorava, ele me ninava assim, era muito da hora. E a minha mãe adora cantar em casa”, lembra com um sorriso no rosto.

A primeira vez a gente nunca esquece e a do João nos palcos podia ter sido bastante traumática. Bem humorado, ele lembra quando foi participar de uma apresentação de flauta doce na escola de música. Atrasado, o pequeno João chegou apenas no final da apresentação. Sempre sorrindo, ele salta no tempo e relembra sua primeira apresentação profissionalmente: uma enorme responsabilidade ainda aos 14 anos, acompanhar Roguesi em uma homenagem ao cantor e compositor Luiz Melodia no show “Estação Melodia”.

A timidez faz com que João tenha respostas muito objetivas, o que nos leva a ficar sempre com um “gostinho de quero mais” para ouvir suas histórias. As memórias de infância, a primeira apresentação, o primeiro show, a primeira composição, o que inspira, o que ouve. Cada passo na entrevista é uma descoberta sobre a vida de alguém que também ainda tem muito a descobrir na vida e nos palcos.

Curiosa, a equipe ficou inquieta para saber como é subir no palco, aos 14 anos, ao lado de quem se admira. “Cara essa primeira apresentação foi muito legal porque foram com mestres, assim, foi com Davi Amorim, Adelbert Carneiro, Paulo Bandeira, Nego Jó e o próprio Roguesi. Foi a primeira vez também que eu tive contato com uma das cantoras que eu mais amo trabalhar, e mais amo tá junto que é a Lorena Monteiro. Então, assim, foi muito importante pra mim!”.

Além do talento nato que João carrega nas mãos, na voz e na mente, ele bebe em fontes primordiais da arte e da cultura paraense, amazônica e brasileira. Sua música e musicalidade, ainda que inatas, são influenciadas por Chico Buarque, Gilberto Gil, Joãozinho Gomes, Vital Lima e Edu Lobo. Mas e de onde vem as composições? Como é falar de amor com tanta profundidade e maturidade para alguém ainda tão jovem? As músicas de João Daibes são verdadeiras crônicas, histórias que ele sonha e vive, e depois toca e canta. “Não é possível, por exemplo, que com 17 anos eu tenha escrito uma música de um amor e tal, muito doido. Eu nunca tinha vivido esse amor, mas eu escrevi porque eu gosto de contar histórias. Eu sou um bom mentiroso, um potoqueiro”, contou se divertindo em meio a gargalhadas.

Quem vê o artista brincalhão em frente às mesmas câmeras das quais fugia no início da entrevista, é até difícil acreditar que aquela pessoa séria, quase que pragmática que sobe aos palcos geralmente atrás de um enorme piano, ou de um diminuto teclado, são a mesma pessoa. João mostrou ao Perfil Jambu um “outro João”. O jovem senhor que é, apaixonado pela música, pelas artes, apaixonado pela família, os amigos e a vida.

Sua paixão está marcada, literalmente, na pele. O desenho tatuado no antebraço esquerdo. A relação de João com o piano é intensa, é quase como um encontro de almas. No início da adolescência, ele, como outros jovens que cresceram em Brasília, o berço de algumas das mais importantes bandas de rock do país, seu sonho era ser guitarrista. Foi o pai quem apresentou o piano para ele que, “torcendo o bico”, quase se recusou a conhecê-lo. Mas o encontro foi um “amor à primeira vista” que proporcionou descobertas sobre si mesmo.

“Porque eu acho que o piano, ele mostra totalmente quem eu sou. Ele é um corpo grande que a primeira vez que eu me deparei com ele, e levei um choque assim. Quando eu vi um piano de fato eu fiquei em choque, porque pra mim, puxa! Dá pra tocar esse negócio gigante. E esse passou a ser o maior amor da minha vida, é onde eu encontro o João de verdade, eu acho que na sua essência mais verdadeira, eu acho que é atrás do piano”.

Sentado em uma poltrona, cercado por equipamentos de um estúdio de TV, adereços cênicos e uma pequena plateia que acompanhava a entrevista, uma nova curiosidade surgiu: quais as dificuldades que alguém, ao mesmo tempo tão sério e talentoso, mas ainda tão jovem, enfrentou em uma carreira iniciada ainda muito cedo? Instrumentista, compositor, cantor, considera que uma das dificuldades que enfrentou até aqui foi a jornada do autoconhecimento. Ele acredita que precisa de um foco, já que tem percorrido vários caminhos dentro da música.

Outra dificuldade que compartilha com outros artistas, principalmente da cena local, é a inserção no mercado de trabalho de fato, no “mainstream”, como ele mesmo pontua. A conversa com João sobre esse assunto mostra que sua riqueza não está assentada no luxo ou na fama, mas nos detalhes e na qualidade de seu trabalho. “Como eu falo pro meu pai, eu não quero tudo, eu quero 2%, 3% que já é muita gente”. Para o futuro, João pretende focar na sua composição e em seu lado cantor e pianista, suas marcas registradas no cenário musical.

Levantando a bandeira da música nortista, o cantor e compositor quer se firmar como um fazedor de música popular brasileira na Amazônia. Ele ressalta, por exemplo, a importância dos festivais de música para isso. Já tendo se apresentado por três vezes no festival Jambu Live, considera que o projeto dá notoriedade e auxilia os artistas a organizarem suas carreiras em diferentes áreas, desde a música às artes plásticas, teatro, dança e gastronomia, por exemplo.

Com uma carreira inteira pela frente, sonhos e anseios, muito generoso e respeitoso, João não é apenas músico, ele é também um contador de histórias, histórias de um amor cotidiano, da beleza das pequenas coisas, na suavidade de sua voz e na delicadeza de suas palavras, quando o dedos tocam sua paixão, o piano, ou seu amante, o violão, eles encantam quem ouve. Seu perfil foi encerrado por uma mui breve apresentação de Chico e outra autoral, finalizada com um “Ré Maior”, sua nota preferida, seguida dos aplausos da pequena plateia que acompanhava a entrevista.

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