
Por Suane Barreirinhas
Não posso, em pleno 2025, continuar naturalizando que ainda não se ensine política como parte do nosso cotidiano, como cultura e direito. Quando falo de política, não estou falando apenas das eleições, embora elas também sejam fundamentais. Falo de políticas públicas, da política da convivência, do funcionamento institucional, do voto, dos direitos, dos deveres, dos partidos. Falo de um ecossistema que, com muito esforço, luta por mais mulheres negras no poder. E, acima de tudo, falo de imaginar um novo lugar para a política.
Não aprendi sobre política na infância. Pelo contrário, esse sempre foi um assunto tabu. E ainda é. Aprendo todos os dias — e também ensino, porque não posso mais viver sem me comunicar sobre esse tema. Fazemos política o tempo todo, mesmo que nos digam o contrário.
Veja o exemplo da Vila da Barca: hoje temos uma Unidade Básica de Saúde graças à mobilização política de pessoas comuns. Houve ausência, houve indignação, houve articulação. Esse é o processo político. Não foi um favor — foi conquista. Foram 30 anos de luta.
Essa ideia de que política não é assunto para todo mundo — ou que só serve para quem tem dinheiro — é uma armadilha. É assim que nos mantêm afastadas. Enquanto isso, seguimos sendo vistas apenas como “voto de cabresto”. E sim, isso ainda é real em 2025.
Em 2016, começa um movimento de romper com essa lógica mais fortemente nas eleições municipais em todo brasil e mulheres negras começaram a ser eleitas e bem votadas, especialmente no Sudeste. Como Marielle Franco (RJ), foi a quinta mais votada nas eleições daquele ano. Áurea Carolina foi a vereadora mais votada de Belo Horizonte, isso tudo na primeira disputa eleitoral. Mas esse movimento não surgiu por acaso, é consequência direta da força coletiva construída ao longo dos anos. É resultado da primavera feminista em 2015, das jornadas de junho de 2013, que não eram “só pelos 20 centavos”, foi muito além disso. Aqui em Belém, no Norte do Brasil, esse avanço na ocupação de mulheres negras na disputa eleitoral, ganha mais força em 2018, com muito mais candidatas disputando a eleição. Isso tudo também é resposta. É resultado de começarmos a entender que política também é nossa, que também é nossa tarefa ensinar e aprender sobre ela.
Falo do meu lugar: o momento em que pude olhar para a urna e ver uma mulher parecida comigo ali, com uma história próxima da minha, foi transformador. Aquilo não era mimimi. Aquilo era pertencimento. Era disputa de narrativa. Era o começo de uma nova política possível.
Hoje, ninguém duvida que o filho do governador será político. Ninguém questiona que os filhos dos políticos herdarão seus cargos, seus esquemas, seus sobrenomes. E nós? Herdamos o quê? A certeza de que só nos procuram nas eleições? Que compram nosso voto por 50 ou 100 reais, enquanto ganham salários de até 45 mil reais por mês — fora todos os auxílios. Faz as contas aí. E tudo isso garantido, sem atraso, por quatro anos.
É urgente romper com essa lógica. Precisamos mudar a fotografia do poder. Refundar os marcos da democracia. Ensinar política nas nossas casas, nos nossos territórios, nas nossas conversas. Porque política não é só sobre o voto — é sobre a nossa vida, o nosso agora e o nosso amanhã.
Política decide como vamos viver. E imaginar esse futuro, juntos e de forma coletiva, é urgente. Porque já não aceitamos um futuro decidido sem a nossa presença.