Da Redação | Foto de capa: Janine Valente
A mostra “Nhe’ẽ Porã: Memória e Transformação” estreia no Museu Emílio Goeldi nesta quarta-feira (7) e permanecerá aberta à visitação até o mês de julho. Belém é a primeira cidade brasileira a receber a nova versão da exposição, que é realizada pelo Museu da Língua Portuguesa e teve sua abertura na sede da instituição, em São Paulo. Com obras de arte feitas por artistas indígenas, objetos etnográficos e arqueológicos e outros itens, “Nhe’ẽ Porã” pode ser visitada no Centro de Exposições Eduardo Galvão, no Parque Zoobotânico do Museu Paraense Emílio Goeldi, até 28 de julho.
A exposição, que tem a curadoria da artista indígena e mestre em Direitos Humanos, Daiara Tukano, convida o visitante a mergulhar na memória, história e realidade atual dos povos indígenas do Brasil, por meio de seu expositório misto e diversificado, que conta com instalações audiovisuais, obras de artes e objetos arqueológicos e etnográficos. Uma das propostas de “Nhe’ẽ Porã” é mostrar outros modos de se ver os territórios materiais e imateriais e as identidades dos povos originários, destacando suas trajetórias de luta e resistência, bem como as belezas de suas culturas.
Daiara conta que as diversas línguas indígenas estão materializadas nos objetos da exposição e refletem as visões desses povos sobre o mundo que nos contorna. “As línguas, a linguagem, o conhecimento e a memória que essas línguas carregam se manifestam nas imagens, nos objetos, nas histórias, nas canções que fazem parte dessa exposição”, explica.
Nhe’ẽ significa espírito, sopro, vida, palavra e fala. E Porã quer dizer belo, bom, na língua Guarani Mbya. Unidos, os dois vocábulos significam “belas palavras”, “boas palavras”, ou seja, palavras sagradas que dão significado à experiência humana no mundo. A frase traduz bem a imersão, proposta pela exposição, nas línguas e culturas que fazem parte das cosmologias indígenas.
Emanoel Fernandes, diretor de museologia do Museu Paraense Emílio Goeldi, destaca o rico acervo do Museu como um dos motivos principais para a realização de Nhe’ẽ Porã na instituição. “O Museu Emílio Goeldi vem pesquisando, preservando e difundindo diferentes aspectos das culturas indígenas na Amazônia, ao longo de toda a sua existência institucional. Uma parte desse conhecimento se reflete no rico acervo etnográfico, arqueológico e linguístico que vem sendo coletado e salvaguardado pelo Museu ao longo de 157 anos de pesquisa. Somos o segundo acervo científico mais antigo do Brasil, que conta com cerca de 4,5 bilhões de registros, um conjunto que se torna mais relevante nacional e internacionalmente se considerarmos o sinistro ocorrido com o Museu Nacional em 2018”, aponta.
Uma das novidades dessa Exposição é a utilização de peças das coleções de etnografia e arqueologia do acervo do Museu Emílio Goeldi, que é o co- realizador da Mostra. Entre os objetos integrados ao expositório estão vários tembetás, peças de quartzo colocadas sob os lábios, e botoques, um tipo de adorno utilizado para alargar o lábio inferior. Ambos são objetos que ressaltam a oratória e a escuta, habilidades valorizadas por muitos povos. O grande destaque às inclusões feitas pelo Museu é um raro banco esculpido em quartzo que, na cosmovisão Tukano, está diretamente associado à Yepário, a avó do universo.
Além de Daiara, outros 50 profissionais indígenas participam da exposição, que tem como co-curadora a antropóloga Majoí Gongora e a consultoria especial de Luciana Storto, linguista especialista no estudo de línguas indígenas, em diálogo com a curadora especial do Museu da Língua Portuguesa, Isa Grinspum Ferraz.
Línguas indígenas e exposição em ritmo fluvial
A exposição tem uma lógica circular guiada por um rio de palavras grafadas em diversas línguas indígenas que atravessa todo o espaço da Mostra, conectando as salas em um ciclo contínuo. No início da exposição, o visitante se depara com uma floresta de línguas indígenas representando a grande diversidade linguística existente hoje no Brasil. Nessa floresta, o público poderá conhecer a sonoridade de várias delas.
A sala ao lado, “Língua é Memória”, traz à tona históricos de contato, violência e conflito decorrentes da invasão dos territórios indígenas desde o século 16 até a contemporaneidade, problematizando o processo colonial que se autodeclara “civilizatório”. Neste ambiente, outras histórias são contadas por meio de objetos arqueológicos, obras de artistas indígenas, registros documentais, recursos audiovisuais, multimídia e mapas criados especialmente para a exposição com dados sobre a distribuição da população e das línguas indígenas pelo território brasileiro.
As transformações das línguas indígenas são tratadas em conteúdos que exploram a resiliência, a riqueza e a multiplicidade das formas de expressão dos povos indígenas. “Colocamos em debate o fato de que somos descritos como povos ágrafos, sem escrita, mas nossas pinturas também são escritas – só que não alfabéticas”, explica Daiara Tukano.
Na terceira sala, o público conhecerá a pluralidade das ações e criações indígenas contemporâneas, distribuídas em nichos temáticos, a partir de seu protagonismo em diferentes espaços da sociedade, a exemplo de sua atuação no ensino, na pesquisa e nas linguagens artísticas. Nesse espaço é possível assistir também a cenas da Marcha dos Povos Indígenas, sob direção do cineasta Kamikia Kisédjê.
Ao acompanhar o percurso do rio, os visitantes alcançam um quarto ambiente, noturno, uma atmosfera onírica introspectiva que permite o contato com a força presente nos cantos de mestres e mestras das belas palavras. O rio que percorria o chão da exposição, agora sobe a parede como uma grande cobra até se transformar em nuvens de palavras – preparando a chuva que voltará a correr sobre o próprio rio, dando continuidade ao ciclo.
SERVIÇO:
Exposição itinerante “Nhe’ẽ Porã: Memória e Transformação”
Local: Centro de Exposições Eduardo Galvão, Museu Paraense Emílio Goeldi , Av. Magalhães Barata, 376 — São Brás.
Período: De 7 de fevereiro a 28 de julho de 2024
Funcionamento: De quarta a domingo, inclusive feriados
Bilheteria: Até maio – das 9h às 14h, com bilheteria até 13h. Depois de junho – 9h às 16h, com bilheteria até 15h
Ingressos: R$ 3,00 (inteira) e R$ 1,50 (meia) e gratuidades garantidas por Lei.