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Por Suane Barreirinhas/Imagem: Ingrid Veloso

Tenho dito repetidamente que nos foi ensinado a não falar sobre política — e o quanto isso nos custa. Nos ensinaram que política era coisa de gente rica, de homem branco, de quem já nasce com tudo pronto. Nas nossas casas, política era briga. Era assunto evitado. Era medo.

Mas recentemente, vivi o oposto disso — e também a confirmação desse silêncio.Em Recife, participei do Conecta Latinas, um encontro potente que reuniu mais de 140 mulheres da América Latina, do Caribe e da África. Todas ali falando de política sem medo. Falando de leis, de eleições, de territórios, de ancestralidade. Pensando juntas em como refundar os marcos democráticos e construir outra política — viva, coletiva, possível. Era política no centro. Sem rodeios, sem disfarces. Porque as nossas vidas exigem isso.

Dias depois, em Belém, participei de outro grande evento. Amazônia no centro do debate, diversas perspectivas, falas fortes, pessoas incríveis que estão fazendo e sendo a diferença. Mas havia um silêncio ali. Ninguém falava de política. Ninguém falava de democracia. Como se esse tema fosse sensível demais, ou chato demais, ou que exigisse uma fala lúdica, quase escondida. Como se falar de política significasse se posicionar — e não é isso. Falar de política é existir com consciência. É colocar a vida no centro da conversa. É defender o direito de estar viva, com dignidade, com liberdade, com futuro.

E aí eu volto à pergunta: por que ainda incomoda tanto quando a gente fala de política? Talvez porque, quando mulheres negras, indígenas, periféricas, ribeirinhas, quilombolas falam de política, elas também começam a mudar quem decide.

Falar de política não é um risco. É um direito. Mais do que isso: é um gesto de futuro.

E se a cultura que nos moldou insiste em silenciar a política do cotidiano, a gente inventa outra cultura: uma onde cabemos, decidimos e transformamos.

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