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A letra do jornalista, cantor e compositor carioca Chico César usa de uma estratégia discursiva para bradar contra o racismo e em prol da valorização dos traços e heranças africanas no Brasil. Mas, em um país que nega suas origens negras, qual a importância do cabelo afro para a nossa história? Neste 20 de novembro, dia da Consciência Negra, o Portal Jambu conversou com a afroterapeuta capilar, Nara Fernandez sobre o assunto.

Por Kelvyn Gomes/Foto: reprodução mídias sociais

No Brasil, a valorização do cabelo crespo ganhou força nos últimos anos. Assumir o cabelo “natural” é uma forma de rejeitar padrões de beleza eurocêntricos. Um fenômeno bastante atual é a “transição capilar”, onde mulheres negras decidem abandonar o alisamento químico e voltar ao cabelo natural. “Desde a infância aprendemos que nossa cor e nosso cabelo não carregam a estética padrão. Por vezes temos nossa auto estima destruída na primeira infância e isso reflete de forma negativa em nossa vida adulta. Através da insegurança emocional, baixa auto estima, não reconhecimento da nossa essência capilar”, afirma a Afroterapeuta capilar, Nara Fernandes.

Nara, idealizadora do primeiro estúdio especializado em cabelos crespos, ondulados e cacheados com foco na ancestralidade capilar de Belém, o Realeza dos Cachos, conta que desenvolveu o método de corte sem padrões e Visagismo Afro. “A especialidade do Studio é cuidar de cabelos com curvatura através de um atendimento humanizado, tratando da saúde e bem estar de quem deseja assumir ou se reencontrar com seu cabelo natural”.

A negação da negritude e dos processos de tentativa de apagar essas características fazem parte de uma trajetória histórico-cultural que gera marcas profundas nas nossas relações e acabam sendo reproduzidas mesmo dentro de casa. “Ainda há muitos desafios a enfrentar, nossas crianças ainda sofrem preconceitos enraizados em brincadeiras, comentários até mesmo da própria família que geram insegurança e uma manada de problemas na construção da auto estima”, explica a Hair Designer.

Então, para que esta relação das crianças com seu cabelo, crespo principalmente, ocorra de forma saudável, muito ainda precisa ser combatido. “O primeiro passo é esse resgate da nossa essência o que nos faz nos acolher e acolher os nossos com o que somos, dos traços que herdamos, da nossa história ancestral. Então, ter espaços especializados, com mulheres que cuidam de outras mulheres com foco na beleza ancestral é de suma importância para o resgate dessa essência que se perde ao longo da vida”, argumenta.

Um pouco de história

O cabelo para diferentes populações africanas não tinha apenas sentido estético. Penteados, formas e adereços podiam simbolizar desde status sociais, origens étnicas e religiosas. Mas a colonização e o sistema escravocrata negaram o direito sobre seus corpos e tentaram apagar suas características sociais e culturais da história do Brasil, por exemplo, como uma forma de embranquecer a nação.

Mais de um século depois da abolição, o processo de negação da negritude brasileira atua repressivamente sobre a população afro-brasileira e o cabelo tornou-se “um elemento simbólico de identidade e resistência, especialmente no contexto da negritude”, é o que afirma Anita Soares em sua dissertação de mestrado publicada em 2018. A pesquisadora pernambucana lembra que autores como Freud, Charles Berg e Edmund Leach associaram o cabelo a significados como castração simbólica ou controle social, mas estudos sobre relações raciais discordam dessas interpretações.

“Para negros e negras, o cabelo, junto com a cor da pele, é um marcador de identidade, historicamente relacionado ao racismo e à negação da beleza. Movimentos históricos como o Rastafari, o conceito de negritude de Aimé Césaire e os movimentos “Black Power” e “Black is Beautiful” ajudaram a ressignificar o cabelo crespo, transformando-o em símbolo de orgulho e resistência política, especialmente nos anos 1960 e 1970”, considera a pesquisadora que tem se dedicado a estudar a relação entre o cabelo e a negritude.

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