Por Gabriel Conrado*
Em ano de pré-COP 30, os olhos e holofotes se voltam todos para a antes esquecida e negligenciada região amazônica, lembrada apenas em tempos de seca ou chuvas intensas no sudeste, que, muitas vezes, são em decorrência do desmatamento e queimadas desenfreadas na maior floresta tropical do mundo e a responsável por ajudar a controlar a quantidade de chuvas que atingem nosso país e países vizinhos.
Logo após o anúncio da tão disputada Conferência das Partes, COP 30, iria acontecer em uma das capitais que fica no coração da Amazônia, eventos que, em pouco mais de 4 séculos, jamais aconteceram na cidade, passaram a ser anunciados, com frentes e temáticas diversas.
Entre tantos eventos, um festival que prometia valorizar, exaltar e enaltecer a cultura Queer brasileira, e principalmente, a cultura Queer amazônida.
Entre produtores e produtoras culturais, fotógrafos e fotógrafas, artistas e comunicadores, uma equipe múltipla de maioria LGBT e amazônida foi contratada fazendo com que muitos acreditassem tanto no objetivo do evento e no que ele poderia trazer de visibilidade para uma comunidade que não luta apenas por garantia de direitos e melhores condições de emprego e renda, mas pelo direito à vida em um país que mais mata LGBTs no mundo.
Um discurso que prometia respeito, mas que ficou apenas na teoria. Regado de relatos de LGTBfobia, capacitismo, racismo, machismo e xenofobia, o que antes era pra ser exaltação, se tornou lamento, tristeza e frustração. Um evento que foi reflexo das opressões que essa mesma comunidade e a população amazônida sofrem: continuamos a ser tratados como menos, sub-humanos, pessoas descartáveis que servem apenas de mão de obra barata e vitrine para agradar olhos de investidores para um evento que já está batendo na porta.
E me pergunto, será essa a realidade de todos os eventos que estão por vir e acontecer? Será que continuaremos a ser tratados como animais enjaulados em zoológicos e circos para que sudestinos e estrangeiros apontem, aplaudam, riem de nós, escolhendo que parte dessa terra, berço de tanta cultura, beleza e história será explorada para satisfazer os interesses financeiros de uma pequena parcela detentora dos meios de produção?
Talvez o que mais doa nessa história toda seja ACEITAR que isso tudo aconteceu por permissão de alguns dos nossos. Mas já dizia bell hooks, onde se tem a busca por poder, não é possível se ter um terreno fértil para o amor. Não o amor romântico, mas o amor que tem como base o respeito.
Acontece que não existe respeito, quando no discurso você quer enfrentar o sistema, e nas atitudes, você quer ganhar os benefícios que ele oferece, mesmo que pra isso custe a manter a opressão, subjugação, desumanização e violação de direitos dos seus, permitindo que a colonização se faça presente nas atitudes disfarçadas de “trabalho de produção”.
Tal qual nossos colonizadores, as novas caravelas estão voltadas para a antes esquecida e negligenciada região Amazônica. Colonizadores do próprio território, “explorando” e “descobrindo” a terra que já tem morador, que vive, cria cultura e arte, mas que é encarada como periferia, área extrativista de mineiros e expropriação de corpos e potências.
Mas tal qual nossos ancestrais, não ACEITAREMOS calados e passivos a invasão de um povo que, em toda sua ignorância e falta de civilidade, subestima nossa ancestralidade e força de resistência.
REJEITAMOS e REJEITAREMOS a insistência em desumanizar um povo historicamente desumanizado.
E não podemos esquecer, que entre os revolucionários cabanos, existiam os infiltrados, mas nem por isso deixamos de ser a única revolução vitoriosa do país.
As novas caravelas estão chegando, munidas de belos discursos, migalhas disfarçadas de boas intenções, e máscaras que sorriem e mentem para nos ludibriar enquanto nos subjugam.
As novas caravelas estão chegando, e nós, os novos cabanos, estamos nos preparando.
Gabriel Conrado, responde pelo @eguapreto, fisioterapeuta, comunicador, mestrando em Ciência política, Sou focado na valorização da cultura e identidade paraense, com uma forte ênfase nas questões raciais e sociais. Trato de temas que combinam com o afro-amazônia, identidade negra e críticas sociais com um mergulho na cultura local, gastronomia e cotidiano no Pará, criando um espaço de expressão e conscientização.
* As opiniões contidas neste artigo são de responsabilidade do autor.
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